Rebaixamento do nível de água dos aquíferos

Rebaixamento do nível de água dos aquíferos: Fundamentos hidrogeológicos e gestão sustentável

Mário Marcelino, Dr.

8/23/20253 min read

Introdução à Hidrogeologia e ao Rebaixamento do Lençol Freático

A hidrogeologia estuda a ocorrência, o movimento, o armazenamento e a qualidade da água subterrânea. Esta água encontra-se nos aquíferos, que podem ser porosos, como areias e cascalhos, ou fraturados, como rochas fissuradas. A água nos aquíferos se move entre poros e fraturas, de forma similar ao que acontece quando se espreme uma esponja: parte permanece armazenada, enquanto outra parte flui lentamente para fora.

O nível do lençol freático, ou nível de água do aquífero, é um indicador do equilíbrio entre entrada e saída de água. Ele sofre rebaixamento quando a retirada de água excede a recarga natural ou artificial, afetando o funcionamento do sistema hidrogeológico e a disponibilidade de água para poços, nascentes e rios.

Recarga e Descarga dos Aquíferos: Relação com o Rebaixamento

O rebaixamento do nível de água ocorre devido ao desequilíbrio entre recarga e descarga:

  • Recarga natural: reposição da água subterrânea por infiltração da chuva. A água percola pelo solo até atingir o aquífero, sustentando o lençol freático. Em aquíferos profundos como o Aquífero Guarani, a recarga ocorre principalmente em áreas de afloramento ou solos permeáveis. A insuficiência de recarga, seja por clima seco ou urbanização, contribui diretamente para o rebaixamento.

  • Descarga natural: saída espontânea da água para nascentes, rios e lagoas. Quando a descarga natural é maior que a recarga, o nível da água cai, evidenciando um rebaixamento gradual do lençol freático. Nascentes da Serra da Canastra que alimentam o rio São Francisco ilustram a importância desse equilíbrio.

  • Descarga artificial: retirada de água por poços tubulares. O bombeamento intenso provoca rebaixamento local e regional, criando depressões no lençol freático. Se o bombeamento supera a recarga, a água do aquífero diminui, comprometendo a sustentabilidade do sistema.

Analogia: imagine um reservatório de água que recebe chuva (recarga) e alimenta torneiras (descarga). Abrir muitas torneiras sem reposição suficiente esvazia o reservatório — exatamente o que ocorre com aquíferos sobreexplorados.

Cone de Rebaixamento: Fenômeno Local e sua Expansão

O cone de rebaixamento é a depressão no lençol freático formada ao redor de um poço bombeado. Ele pode ser visualizado como um funil dentro de um copo d’água quando sugamos água com um canudo.

  • Rebaixamento local: afeta diretamente o poço e regiões próximas. Poços vizinhos podem ter seus cones sobrepostos, reduzindo vazões individuais e aumentando o risco de seca, especialmente em poços rasos.

  • Exemplos urbanos: cidades do interior paulista, como Ribeirão Preto, dependem do Aquífero Guarani e já registraram rebaixamento local intenso devido à concentração de poços tubulares.

Rebaixamento Regional e Superexploração

Quando o bombeamento é contínuo e intenso, ocorre um rebaixamento regional, afetando todo o sistema aquífero:

  • Seca de poços rasos, comprometendo abastecimento rural e comunitário;

  • Redução de vazões de rios e nascentes, pois a água subterrânea sustenta parte do fluxo superficial;

  • Maior custo energético para bombeamento, devido à extração de águas mais profundas.

Fatores agravantes:

  • Urbanização: impermeabilização do solo por concreto e asfalto reduz infiltração da chuva, diminuindo recarga e acelerando o rebaixamento;

  • Distribuição desigual de poços: concentrações de extração em determinadas áreas intensificam o fenômeno.

Cidades como São Paulo e Campinas apresentam rebaixamento do lençol freático em áreas densamente perfuradas, evidenciando a relação direta entre urbanização, exploração e queda de níveis de água.

Gestão Sustentável e Mitigação do Rebaixamento

Evitar a depleção dos aquíferos exige medidas de gestão que controlem e monitorem o rebaixamento:

  • Monitoramento constante do nível de água em poços de observação, permitindo identificar áreas críticas;

  • Regulação de poços e outorgas, evitando sobreposição de cones de rebaixamento e concentração de extração;

  • Incentivo à recarga artificial, como bacias de infiltração, áreas verdes permeáveis e técnicas de reuso;

  • Planejamento integrado entre água superficial e subterrânea, garantindo equilíbrio hídrico.

No Brasil, o Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio Jundiaí (SP) exemplifica como a gestão participativa pode conciliar uso urbano, agrícola e industrial, preservando níveis adequados de água subterrânea.

Conclusão

O rebaixamento do nível de água em poços tubulares reflete o desequilíbrio entre extração e recarga dos aquíferos. Assim como uma conta bancária precisa de depósitos para sustentar saques, os sistemas aquíferos necessitam de reposição contínua para manter a disponibilidade hídrica.

A gestão sustentável é essencial não apenas para garantir abastecimento atual, mas também para preservar a água subterrânea frente ao crescimento urbano, à expansão agrícola e às mudanças climáticas, protegendo este recurso vital para as gerações futuras.