O PGRS como ferramenta estratégica

Como transformar o PGRS em ferramenta estratégica — e não só obrigação legal

Mário Marcelino, Dr.

10/28/20254 min read

♻️ Como transformar o PGRS em ferramenta estratégica — e não só obrigação legal

O Plano de Gerenciamento de Resíduos Sólidos (PGRS) nasceu como um instrumento de conformidade. Exigido pela Lei nº 12.305/2010 (Política Nacional de Resíduos Sólidos — PNRS), ele foi pensado para garantir que empresas planejem e controlem a destinação de seus resíduos de forma ambientalmente adequada.

Mas o que era visto apenas como documento obrigatório pode — e deve — ser transformado em um instrumento estratégico de gestão, redução de custos e geração de valor.

1️⃣ Do papel à prática: o PGRS como mapa de oportunidades

A maior limitação dos PGRS tradicionais é que eles se restringem a “cumprir tabela”: listar resíduos, indicar destinações e comprovar transporte.


No entanto, quando bem elaborado, o PGRS se torna um diagnóstico de eficiência produtiva e ambiental — um verdadeiro mapa de oportunidades para redução de desperdícios, reaproveitamento de materiais e otimização de processos.

Empresas que integram o PGRS à sua gestão de processos e indicadores ESG conseguem:

  • Reduzir custos com destinação e transporte;

  • Identificar perdas de matéria-prima e gargalos de produção;

  • Criar indicadores de eficiência ambiental (kg de resíduo / unidade produzida);

  • Estabelecer metas de redução e circularidade;

  • Comprovar resultados em relatórios de sustentabilidade e auditorias externas.

Em outras palavras: o PGRS deixa de ser custo e vira instrumento de gestão.

2️⃣ Base técnica e obrigatoriedade

A PNRS (Lei 12.305/2010) e o Decreto 7.404/2010 determinam que o PGRS é obrigatório para:

  • Geradores de resíduos industriais, de serviços de saúde, construção civil, transporte e mineração;

  • Estabelecimentos comerciais e de serviços que gerem resíduos perigosos;

  • Empreendimentos licenciáveis ambientalmente.

O conteúdo mínimo inclui:

  1. Identificação e classificação dos resíduos (NBR 10004/2004);

  2. Origem, volume e características;

  3. Segregação, acondicionamento e armazenamento;

  4. Transporte e destinação final;

  5. Responsáveis e controles operacionais;

  6. Procedimentos de monitoramento e metas.

Esses itens formam a espinha dorsal da gestão integrada de resíduos. Quando digitalizados e conectados a indicadores de desempenho (ex.: via BI, Power BI ou softwares ambientais), ganham poder analítico e estratégico.

3️⃣ Casos reais e boas práticas

Indústria Automotiva – redução de custos e rastreabilidade

Uma montadora em São Paulo reduziu 25% do custo de destinação ao integrar seu PGRS a um sistema de controle interno de resíduos (coleta, armazenamento e transporte). O mapeamento revelou materiais recicláveis antes classificados como “rejeito”, possibilitando contratos de venda com recicladores.


Resultado: economia anual superior a R$ 400 mil e melhoria nos indicadores ESG.

Construção civil – indicadores ambientais como diferencial competitivo

Empreendimentos que estruturam seus PGRS com metas e rastreamento (ex.: construtoras com certificação LEED e AQUA) conseguem não só reduzir volumes enviados a aterro, mas também pontuar melhor em certificações ambientais, agregando valor ao imóvel e à marca.

Indústria química – logística reversa e compliance

Empresas do setor químico e farmacêutico vêm adotando PGRS integrados à logística reversa, garantindo retorno de embalagens e resíduos perigosos ao ciclo produtivo.
Além da conformidade com a PNRS, o sistema melhora a imagem institucional e evita penalidades da CETESB e IBAMA.

4️⃣ O PGRS como instrumento de ESG e economia circular

No contexto do ESG (Environmental, Social, Governance), o PGRS se conecta diretamente às metas de sustentabilidade corporativa. Ele é uma ferramenta de evidência e mensuração de resultados ambientais, podendo alimentar relatórios de sustentabilidade (GRI, SASB, CDP) e reforçar compromissos de economia circular.

A integração com o E (Environmental) é direta:

  • Redução de geração → eficiência energética e de recursos;

  • Aumento de reciclagem → emissões evitadas;

  • Reuso de materiais → menor extração de recursos naturais.

Além disso, um PGRS bem estruturado pode servir de base técnica para obtenção de selos verdes, licenças ambientais e financiamentos sustentáveis, já que comprova controle, rastreabilidade e indicadores.

5️⃣ Caminho para transformar o PGRS em ferramenta estratégica

  1. Ir além do cumprimento legal: trate o PGRS como ferramenta de inteligência ambiental.

  2. Digitalizar os dados: adote planilhas dinâmicas, dashboards e plataformas de gestão.

  3. Integrar indicadores de produção: relacione geração de resíduos à eficiência produtiva.

  4. Capacitar a equipe: envolva setores de operação, compras e manutenção — não apenas o meio ambiente.

  5. Estabelecer metas e revisões anuais: o PGRS deve ser vivo e atualizado com resultados.

  6. Comunicar resultados: compartilhe indicadores nos relatórios ESG e redes profissionais.

6️⃣ Conclusão — do cumprimento à competitividade

Quando as empresas deixam de ver o PGRS como mera exigência burocrática e passam a enxergá-lo como ferramenta estratégica, elas transformam um custo regulatório em vantagem competitiva e reputacional.


Um bom PGRS revela ineficiências, gera economia e contribui para a sustentabilidade corporativa.
Mais que um documento, ele é um espelho da maturidade ambiental da organização.

Referências e bases técnicas

  • Lei nº 12.305/2010 – Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS)

  • Decreto nº 7.404/2010 – Regulamentação da PNRS

  • ABNT NBR 10004/2004 – Classificação de resíduos sólidos

  • ABNT NBR 11174/1990 – Armazenamento de resíduos perigosos

  • CETESB – Manual de PGRS (2023)

  • GRI 306 (Resíduos) – Global Reporting Initiative, 2021

  • Casos empresariais: Braskem (reciclagem química), Ambev (meta de 100% embalagens retornáveis), Votorantim (redução de resíduos de cimento).