Nascentes: definição e identificação de Área de Proteção Permanente

Aspectos técnicos e legais para a definição de nascente e caracterização da área de Proteção Permanente.

Mário Marcelino, Dr.

9/4/20252 min read

Nascentes: definição e identificação de Área de Proteção Permanente

A nascente é, em termos hidrogeológicos, a manifestação em superfície da água subterrânea contida na zona de saturação, geralmente sustentada por uma camada de baixa permeabilidade. Ela pode se apresentar como um afloramento concentrado (olho d’água) ou difuso (espraiado/vereda).

O Código Florestal (Lei 12.651/2012) define como Área de Preservação Permanente (APP) o raio mínimo de 50 metros ao redor de nascentes e olhos d’água perenes, qualquer que seja sua situação topográfica. O dispositivo substituiu trechos das antigas resoluções CONAMA (como a nº 303/2002), mas manteve o princípio protetivo. Para veredas, a proteção mínima segue em 50 metros a partir do limite do espaço brejoso e encharcado, garantindo a conservação desse ecossistema singular.

Do ponto de vista técnico, uma nascente não deve ser confundida com qualquer surgência ou acúmulo de água. Para ser caracterizada como tal, deve haver afloramento natural de água subterrânea. Já os lençóis suspensos (perched water tables) ou acumulações superficiais decorrentes de solos argilosos hidromórficos não se enquadram como nascentes, ainda que demandem atenção ambiental.

As nascentes podem ser classificadas em:

  • Concentradas (olhos d’água): quando a descarga do aquífero ocorre em um ponto específico.

  • Difusas ou espraiadas (veredas): quando a superfície freática intercepta o terreno em uma faixa mais ampla, resultando em diversas surgências de pequeno porte.

  • Perenes, temporárias ou efêmeras: conforme a continuidade do fluxo de água.

Esse enquadramento é importante porque influencia tanto a aplicação da legislação quanto as estratégias de proteção e recuperação. A Cartilha Técnica “Preservação e Recuperação de Nascentes” (CBHs-PCJ, 2007) reforça essas distinções e orienta práticas de manejo e restauração.

Um ponto de frequente equívoco em campo é confundir áreas encharcadas após chuvas ou pontos de infiltração bloqueados por camadas argilosas com nascentes. Embora possam gerar surgências superficiais, esses casos não representam afloramentos diretos do lençol freático. Outro exemplo de falsa nascente ocorre quando há afloramento de águas de infiltração em camadas geológicas de baixa permeabilidade antes de atingir o aquífero principal.

Nem sempre é viável realizar sondagens ou métodos geofísicos detalhados, mas a interpretação correta da paisagem, associada a observações estruturais e hidrogeológicas, é essencial para evitar conflitos legais e garantir a efetiva proteção ambiental. Assim, a correta identificação de nascentes exige conhecimento técnico de geologia e hidrogeologia locais. A Figura 1 ilustra um fluxograma simplificado de identificação e classificação de nascentes.

Figura 1 - Fluxograma simplificado de classificação de nascentes

Em resumo: a legislação atual assegura APP de 50 metros para nascentes perenes, reconhecendo seu papel fundamental na manutenção da quantidade e qualidade da água nos sistemas hídricos. Já a interpretação técnica em campo deve ser criteriosa, evitando classificações equivocadas que possam gerar insegurança jurídica e comprometer tanto a conservação ambiental quanto o uso sustentável da terra.