Gestão de aquifero
A gestão de sistemas aquíferos: Desafios e o caso internacional do Sistema Aquífero Guarani
Mário Marcelino, Dr.
8/9/20253 min read


A GESTÃO DE SISTEMAS AQUÍFEROS: DESAFIOS E O CASO INTERNACIONAL DO SISTEMA AQUÍFERO GUARANI
Independentemente de sua extensão — local, regional ou transfronteiriça — a gestão de um sistema aquífero deve ser baseada em informações atualizadas, transparentes e amplamente acessíveis. Somente assim é possível garantir a sustentabilidade do recurso hídrico subterrâneo, a qualidade da água e a disponibilidade hídrica a longo prazo, para múltiplos usos.
Um exemplo emblemático é o Sistema Aquífero Guarani (SAG), um dos maiores reservatórios subterrâneos de água doce do planeta, com aproximadamente 1,2 milhão de km² de extensão. Localizado no centro-leste da América do Sul, o SAG abrange áreas dos territórios de Brasil, Argentina, Paraguai e Uruguai, sendo que o Brasil detém a maior parte do aquífero, com cerca de 61,65% da área total. Trata-se de um super aquífero transfronteiriço, cuja gestão exige cooperação internacional, diálogo contínuo entre os países envolvidos e mecanismos compartilhados de proteção e monitoramento.
Assim como ocorre com qualquer recurso hídrico subterrâneo, a gestão de um sistema aquífero enfrenta desafios particulares, decorrentes das próprias características desse tipo de reservatório. Entre os principais obstáculos estão:
Baixa visibilidade do recurso, já que a água está armazenada abaixo da superfície;
Resposta lenta às ações de manejo, o que dificulta a avaliação imediata da efetividade de intervenções;
Alto custo na obtenção de dados diretos, frequentemente dependentes da perfuração de poços tubulares profundos;
Desconhecimento da população e até de gestores sobre o funcionamento do sistema aquífero.
No caso do SAG, por exemplo, a profundidade das reservas pode variar de algumas dezenas de metros nas áreas de recarga até mais de 1.500 metros em zonas de confinamento. Isso amplia a complexidade técnica e econômica das ações de monitoramento e controle.
Além disso, quanto maior e mais interdependente for o sistema aquífero, maior será o número de usuários e interesses envolvidos, o que aumenta os desafios para o controle do uso, prevenção da contaminação e mediação de conflitos. Por isso, a gestão de aquíferos — sobretudo os compartilhados entre países — deve estar fundamentada em três pilares essenciais, sustentados por conhecimento técnico-científico confiável:
1. Proteção do recurso
Compreende ações destinadas à preservação da integridade física e ambiental do aquífero, com foco na proteção da recarga, controle de usos do solo e mitigação de riscos de degradação, tanto quantitativa (excesso de extração, redução da recarga, rebaixamento piezométrico) quanto qualitativa (contaminação por poluentes). Entre os principais riscos estão:
Lançamento de efluentes urbanos e industriais;
Uso excessivo e incorreto de agrotóxicos;
Manejo inadequado do solo;
Desmatamento das áreas de recarga;
Exploração hídrica insustentável;
Perfuração e uso de poços clandestinos e não monitorados.
2. Instrumentos de gestão
Para evitar o uso predatório e descoordenado do recurso, é indispensável um arcabouço legal e institucional sólido, que vá além da simples definição do que pode ou não ser feito. Esse sistema deve incluir:
Normas técnicas e legais claras;
Fontes de financiamento e critérios para uso dos recursos;
Estruturas de governança (instituições, conselhos, agências);
Bancos de dados públicos e integrados;
Incentivo à produção de conhecimento técnico e científico;
Cooperação entre entes públicos, privados e sociedade civil.
No caso do SAG, esse esforço vem sendo realizado desde os anos 2000, com apoio de organismos internacionais, por meio do Projeto para a Proteção Ambiental e Desenvolvimento Sustentável do Sistema Aquífero Guarani. Esse projeto estabeleceu bases comuns para o monitoramento e gestão integrada do aquífero entre os quatro países, algo raro e exemplar no contexto global.
3. Gerenciamento do uso
Trata-se de estabelecer regras claras para a extração, uso e controle das águas subterrâneas, com base em critérios técnicos e sustentáveis. Isso inclui:
Outorga e licenciamento de uso;
Monitoramento contínuo da exploração;
Zoneamento hidrogeológico;
Definição de áreas prioritárias para conservação;
Planejamento estratégico de longo prazo, especialmente em regiões com tendência à escassez hídrica.
Considerações finais
A gestão de sistemas aquíferos é um desafio que exige integração entre ciência, política pública, legislação, cooperação institucional e participação social. Quando esses recursos ultrapassam fronteiras nacionais, como no caso do Sistema Aquífero Guarani, essa complexidade se multiplica e exige uma visão compartilhada, diplomacia hídrica e mecanismos de gestão conjunta.
Em tempos de crescente escassez de água e intensificação das pressões sobre os recursos naturais, a gestão eficiente e cooperativa dos aquíferos será fundamental para a segurança hídrica e o desenvolvimento sustentável das próximas gerações.
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