Avaliação de Impacto Ambiental dos Recursos Hídricos em Obras Rodoviárias

Principais aspectos técnicos a considerar

Mário Marcelino, Dr.

11/18/20253 min read

Avaliação de Impacto Ambiental dos Recursos Hídricos em Obras Rodoviárias

1. Caracterização hidrogeológica inicial

A Avaliação de Impacto Ambiental de uma obra rodoviária deve iniciar obrigatoriamente com a caracterização detalhada da água subterrânea na área de influência. Isso inclui: identificação de aquíferos, profundidade do nível freático, direção e velocidade dos fluxos subterrâneos, vulnerabilidade natural (solo, litologia, presença de fraturas), poços de captação próximos, nascentes e zonas de recarga.

Essa etapa define a sensibilidade hidrogeológica, permitindo prever rotas de migração de contaminantes, riscos de poluição difusa, e projetar medidas de mitigação adequadas tanto para a fase de obra quanto para a fase de operação.

2. Metodologia geral de avaliação

A AIA deve seguir uma abordagem estruturada do tipo fonte → via → receptor, identificando potenciais fontes de impacto (cortes, movimentação de solo, postos de abastecimento, tráfego intenso, resíduos veiculares), as vias pelas quais esses impactos alcançam os recursos hídricos (escoamento superficial, infiltração, drenagens subterrâneas), e os receptores sensíveis (córregos, rios, lagos, poços, zona saturada e não saturada do subsolo).

Devem ser avaliados também cenários de chuva intensa, falhas operacionais, acidentes rodoviários e processos erosivos.

3. Drenagem superficial e proteção hídrica durante a obra

Durante a construção, o controle do escoamento superficial é essencial. A obra deve incluir desvio de águas pluviais, bacias de sedimentação, barreiras filtrantes, proteção de taludes, revegetação temporária e sistemas de dissipação de energia em pontos críticos. Pequenos barramentos, rissos, sarjetas e caixas de drenagem devem ser projetados para reduzir velocidades, diminuir erosão e evitar a descarga direta de sedimentos em corpos d’água.

Esses sistemas devem estar dimensionados conforme área de contribuição e intensidades pluviométricas da região, e devem ser monitorados com inspeções regulares.

4. Erosão, sedimentos e qualidade da água superficial

A movimentação de solo expõe áreas vulneráveis à erosão, gerando carreamento de sedimentos para rios e galerias de drenagem. Esse processo aumenta turbidez, assoreamento, perda de habitats aquáticos e pode comprometer captações de água.

A AIA deve estimar cargas de sedimento esperadas, mapear pontos críticos e aplicar medidas como: divisão da obra por fases, limitação de áreas escavadas simultaneamente, proteção de pilhas de solo, uso de geotêxteis e manutenção constante das bacias de sedimentação.

5. Emissões veiculares, resíduos de pneus, óleos, graxas e poluentes

Durante a operação da rodovia — e em menor escala durante a obra — ocorre a deposição contínua de resíduos e contaminantes gerados pelo tráfego, incluindo:

  • micropartículas de borracha provenientes do desgaste de pneus;

  • resíduos metálicos dos sistemas de freio;

  • partículas de combustão (material particulado, hidrocarbonetos, metais pesados como Zn, Pb, Cu);

  • óleos, graxas e fluidos veiculares que pingam ou caem das carretas;

  • poluentes atmosféricos que precipitam com a chuva (chuva ácida leve, aerossóis, fuligem).

Todos esses contaminantes são carreados pelo escoamento superficial e entram nas drenagens superficiais e subterrâneas, podendo atingir rios, lagos e aquíferos.
A AIA deve prever dispositivos específicos para capturar e tratar esses poluentes, tais como:

  • caixas separadoras de água e óleo (SAOs);

  • valas filtrantes com meios adsorventes;

  • bacias de contenção com camada oleofílica;

  • galerias com anteparos de retenção;

  • dispositivos de sedimentação e filtração para microresíduos de pneus.

Esses sistemas precisam ser periodicamente monitorados, limpos e substituídos para garantir eficiência.

6. Áreas de abastecimento e prevenção à contaminação do solo e das águas

Locais destinados a abastecimento, manutenção e lavagem de máquinas ou veículos devem possuir pisos impermeabilizados, drenagem isolada e bacias de contenção. Procedimentos operacionais específicos devem evitar o derramamento de combustíveis e óleos.

Quando localizados sobre aquíferos vulneráveis ou próximo a cursos d’água, exigem dupla proteção e kits de emergência sempre disponíveis.

7. Pós-obra: monitoramento e operação segura da rodovia

Após a entrega da rodovia, deve-se implementar um Programa de Monitoramento Hidrológico e Hidrogeológico, incluindo:

  • inspeção e manutenção periódica das drenagens;

  • análise de qualidade da água superficial e subterrânea;

  • monitoramento da eficiência de caixas separadoras, filtros, bacias de detenção e sistemas de contenção;

  • avaliação de erosão residual e integridade de taludes.

Também é obrigatória a existência de um plano de resposta a emergências, com foco em acidentes envolvendo produtos perigosos. O plano deve prever contenção rápida de derrames, bloqueio de galerias, acionamento de equipes especializadas e comunicação imediata aos órgãos ambientais.

8. Governança, responsabilidade e integração ao projeto

Todas as medidas ambientais devem constar nos contratos, especificações técnicas e responsabilidades da construtora e da futura operadora (concessionária ou órgão público).
A adequada gestão dos recursos hídricos depende de fiscalização contínua, auditorias ambientais e atualização dos planos de contingência conforme novas tecnologias ou padrões ambientais.